O Empregado Pode Prestar Serviços a Outro Empregador Durante as Férias?

A possibilidade de um empregado exercer atividade laborativa para outro empregador durante o período de gozo de férias regulamentares é objeto de frequente indagação tanto por parte de trabalhadores quanto de empregadores. A resposta, entretanto, demanda análise cuidadosa da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), da finalidade jurídica das férias, bem como da jurisprudência consolidada do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs).

A Finalidade Jurídica das Férias e a Proteção à Saúde do Trabalhador

O direito às férias está previsto no artigo 129 da CLT e encontra fundamento também no artigo 7º, inciso XVII, da Constituição Federal de 1988. Trata-se de um direito de natureza indisponível, ou seja, não pode ser renunciado ou negociado pelo titular. Assim, percebe-se que a finalidade das férias é proporcionar ao trabalhador um período de descanso, recuperação física e mental, após doze meses de exercício contínuo de suas atividades laborais.

A jurisprudência trabalhista, em consonância com o espírito protetivo do Direito do Trabalho, reconhece o caráter de norma de ordem pública das disposições relativas às férias. Isso implica dizer que o descanso anual remunerado não pode ser objeto de flexibilização por iniciativa do empregado ou do empregador.

A Proibição Expressa do Artigo 138 da CLT

Nessa óptica, é preciso pontuar que, segundo o artigo 138 da CLT, é expressamente proibido ao empregado prestar serviços a outro empregador durante o período de férias:

“Durante as férias, o empregado não poderá prestar serviços a outro empregador, salvo se estiver obrigado a fazê-lo em virtude de contrato de trabalho regularmente mantido com aquele.”

O dispositivo legal, portanto, excepciona apenas os casos em que já exista um vínculo empregatício anterior com o segundo empregador, isto é, contratos simultâneos que tenham sido firmados antes do início do período de férias em qualquer dos vínculos.

A norma visa resguardar a efetividade do descanso conferido pelas férias, pois o labor em outro vínculo compromete diretamente a finalidade do instituto. Mesmo que o trabalhador consinta com a prestação de serviço a terceiro durante as férias, tal conduta é juridicamente inválida.

Contratos Simultâneos: A Única Exceção Legal

A única hipótese admitida pela legislação é aquela em que o trabalhador mantém dois vínculos empregatícios regulares e simultâneos. Neste caso, o gozo de férias em um dos contratos não impede o exercício da atividade no outro vínculo, desde que este não esteja concedendo férias concomitantemente.

Por exemplo, se um empregado atua como auxiliar administrativo durante o dia para uma empresa e como porteiro à noite para outra, poderá continuar trabalhando no segundo vínculo durante o período em que estiver em férias no primeiro, desde que o contrato seja preexistente. Trata-se de situação legalmente permitida e pacificada na jurisprudência.

Contudo, não é permitido ao empregado iniciar um novo vínculo empregatício apenas durante as férias. Isso configuraria afronta direta ao artigo 138 da CLT, podendo gerar, inclusive, consequências para o novo empregador, que passaria a fazer parte de uma relação jurídica viciada.

A Jurisprudência do TST: Proteção ao Período de Descanso

A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é uníssona ao considerar ilícita a prestação de serviços durante as férias, salvo no caso de vínculo empregatício preexistente. A prática reiterada das turmas do TST é no sentido de que, havendo labor neste período, mesmo que parcial, o empregador deverá pagar as férias em dobro, nos termos do artigo 137 da CLT.

Um exemplo emblemático é um julgamento em que a Corte (TST) consolidou o entendimento de que, uma vez comprovado o desempenho de atividades laborais durante as férias, o empregador deve arcar com o pagamento em dobro de todo o período, independentemente da quantidade de dias efetivamente trabalhados. Tal entendimento reforça a importância do período de descanso para o colaborador

Importante mencionar também que a reforma trabalhista de 2017 trouxe novas diretrizes sobre as férias. As normas referentes à concessão de férias sofreram alterações significativas. E, desde então, tornou-se possível o fracionamento do período de férias em até três partes, contanto que haja anuência expressa do empregado. Salienta-se que nessa divisão, é indispensável que um dos períodos tenha no mínimo 14 dias consecutivos, enquanto os outros dois não podem ser inferiores a cinco dias corridos cada.

Reflexos Trabalhistas e Riscos Jurídicos

A violação ao disposto no artigo 138 da CLT pode gerar múltiplos reflexos jurídicos, tanto para o trabalhador quanto para o empregador.

Para o empregador original, que venha a admitir ou consentir com o trabalho do empregado durante as férias, ainda que em outro estabelecimento, subsiste o risco de nulidade do período de férias concedido, com a consequente obrigação de pagar o valor das férias em dobro.

Já para o empregador que venha a contratar o empregado exclusivamente para trabalhar durante as férias de outro vínculo, há o risco de responder por eventual dano decorrente da inobservância das normas trabalhistas, notadamente em caso de acidente de trabalho ocorrido no período.

Ademais, tal contratação pode ser interpretada como violação aos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, gerando questionamentos judiciais quanto à validade do pacto laboral estabelecido.

Considerações Finais

A legislação trabalhista brasileira é clara ao proibir que o empregado preste serviços a outro empregador durante o período de férias, exceto nos casos de contratos de trabalho simultâneos e preexistentes. A jurisprudência dos Tribunais Superiores e Regionais reforça a interpretação literal do artigo 138 da CLT, impondo ao infrator — empregador ou empregado — o ônus do descumprimento normativo.

Portanto, o descanso anual remunerado deve ser usufruído de maneira efetiva, sob pena de nulidade da sua concessão. Tanto o empregador quanto o empregado devem estar atentos à legislação e à finalidade protetiva das férias, de modo a preservar a integridade da relação de trabalho e evitar consequências jurídicas indesejadas.


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